Le soi-disant

Ma photo
Nom :
Lieu : SG, RJ, Brazil

samedi, mars 14, 2009

A abençoada


“Um livro tem a capacidade de dar conforto a uma alma, levar luz a um sorriso, trazer paz a olhares esbranquiçados. Um simples livro, o mais singelo ou o mais terreno que seja, tem a capacidade de abençoar uma alma que não fôra abençoada”.
William GO (inspirado em Clarice Lispector)


Dedico esse pensamento a uma aluna e pessoal muito especial da ADM9. Luana, Obrigado por me ensinar muito através de seus textos, dos seus gestos e do seu silêncio.





Era tarde quente e mesmo com calor infernal, sujeitei-me em levar as crianças ao parque. Na verdade fugia do meu editor, que mais uma vez cercava-me e me afrontava com sua mais preferida palavra diabólica: “deadline”. Mas o mais tortuoso e ignorante erro me aconteceu, pior que levar comigo três crianças –uma com gripe - ao parquinho próximo ao inferno de enxofre, por alguns conhecido como: “Baixo Leblon”. Qual erro? Levar meu celular à tira colo. Entretanto que poderia eu fazer? Um filho doente, uma mãe doente e um editor histérico? Foi então que decidi sentar-me e ouvir com carinho ácido o destino que coube ao mundo me dar.

As crianças dispersaram-se em meio à selva infanto-juvenil, nunca imaginei que haveria tantas numa tarde escaldante como aquela. E eu desnuda e evidenciada como um alvo preste a ser atingido por mais um gracejo desse mundo sádico que é o meu. Quando um evento, um simples épico desalento quebra com ríspida doçura a neblina angelical que rodeava minha mente cansada e desesperada. Uma mulher em desesperos conversava com outra. Encostadas num banco, desses escolhidos avidamente por uma pessoa que deseja fugir do mundo e bem atrás de uma árvore. “Como não vi esse banco antes!?”, me perguntei. Maior que a árvore robusta era a intensa antítese presente na cara crua e sem luz da mulher. Ela gesticulava, sofrida apertava um cigarro. E eu ali, observando e vivendo como minha a vida alheia.

Como uma sombra veio a minha menina do meio. Ao me ver de lábios franzidos e coração apertado, a minha filha me salvou. Sentou-se no meu colo de maneira lânguida e me perguntou qual era a causa da minha dor. Eu lhe respondi que era o meu sofrimento. Num conforto quase desumano, a mulher não tão amiga sinaliza para a outra que se necessário, ligasse para ela, caso algo aconteça e assim ela se foi. Virou-se apalpando algo que logo se transforma em uma agenda. “Essa moça não deve ler, mamãe!”, diz minha grande menina. “Desculpa, sim...”, respondo desorientada. “Porque quando eu caí e me machuquei, você e o papai me levaram para o hospital, e o papai muito nervoso falava que a culpa era sua e do seu livro...”. “Meu amor, mamãe não te entende!”, cortei-a com uma certa revolta interna. “Então, lembro que você tirou um livro, um livro muito bonitinho e começou a ler para mim?”, diz a sábia mexendo em meus cabelos. “A vida íntima de Laura, esse livro? O da Clarice?”, perguntei espantada. “Uhunn”, balbuciou. “Quando a vó Rosa tava muito mal no hospital, lembra mamãe? E você lia para ela um livrinho preto e ela sempre sorria, pedia para você nunca parar...”, dizia enquanto amarrava e desamarrava com delicadeza os laços do vestido. “Sim, era a Bíblia. A vovó era muito religiosa (abracei-a e recostei-a no meu peito) e dizia que essa era sua forma de estar mais próxima de Deus”, de maneira doce e grata eu a explicava. Era a primeira vez no dia em que ouvia palavras doces e amenas. “Assim como o papai abraça e beija a tv quando tem jogo? É a maneira dele de ficar mais próximo do jogador, do gol ou da bola?”, coçava a cabeça confusa e eu ria de prazer. “Vai brincar vai! E obrigada por não me trocar por uma agenda”, respondia sorridente, atenciosa ao mesmo tempo a mandava brincar com seus irmãos.

Na verdade disfarçava o choro, que estava prestes a desaguar das minhas nuvens tempestuosas e negras feitas de pensamentos. Típicas de um dia forte e rascante como aquele. Foi assim que percebo quanto o destino fôra bom comigo. Talvez não seja tão sádico e irônico como sempre me fôra mostrado. Talvez eu não esteja tão necessitada de um banco pequeno atrás de uma árvore para me esconder. Talvez não precise de muros ou mesmo tratar das enfermidades dos outros para não ver as minhas. Talvez por não ver essas enfermidades, eu não consiga dar ao mundo a cura que o mesmo merece. Quantas pessoas se escondem atrás de suas árvores ou editores diariamente? Talvez esse seja meu “deadline”, meu prazo para mudar. Foi assim que decidi seguir em frente e salvar aquela mulher de maneira justa e divina que antes fui salva.
Essa já estava calma. Olhou-me e através dos seus muros tentava manter em seus olhos a mais falsa dignidade. “Olá, desculpe. Como faz calor, não!?”, comentei tirando da bolsa uma caixa de lenços. “Sim...” me respondeu insegura. “Tome. Sempre os trago comigo. Tanto calor, óculos embaçados. Você sabe”.Sorri com doçura. Travestindo o real intuito para os lenços. “Meus filhos. (mostrou-me) O mais velho tem 7 anos, o outro 3. Você tem filhos?”, perguntou-me ainda com resistência e rebeldia ocular. “Sim. Três. (sorri) Dois meninos e uma menina. Estão brincando no parquinho! Olha lá junto com os seus!”, disse. Enquanto sorríamos e contemplávamos nossas criaturinhas. “Desculpa, mas não pude deixar de ver sua dor, ali do banco onde estava. Você quer falar sobre isso com uma estranha? (risos meus)”. Falei de maneira bordada, sentia sua segurança. “Sabe, estranha. (risos dela) Eu me pergunto se é isso que eu desejava a mim há dez anos. Eu era tão viva, tão feliz. Não me entenda mal, eu sou muito feliz com meu marido e meus filhos (cortou-me defendendo sua alcatéia).


"Mas algo morreu em mim. Como se a vida me tivesse desfeita em partes. Um pouco em levar as crianças à escola, numa outra em tentar manter uma casa, ou quando tenho que ser pai e mãe; meu marido viajava muito. E em muito, muito mais farelos quando vou e volto ao trabalho (risos dela)”. Disse-me, olhando com um olhar amigo. “Eu entendo bem”, ri e olhei para um ponto fixo qualquer. “Minha filha disse que a minha forma única e doce de mostrar carinho, a feição ou mesmo amor humano é ler. Acho que as pessoas têm fé na minha voz, nos meus olhos. Só queria também saber me ver, me ler me ouvir, sabe “, desabafei meio enrubescida”.Sua família deve sentir muito orgulho de você!”, disse segurando minhas mãos e sorrindo como uma irmã.
Meu telefone tocou. E porque o toque do mesmo era terror absoluto que me eriçava a pele? Sim era meu editor e seu inferninho jornalístico. “Desculpa. Meu editor terrorista. Se eu mandasse para ele cada fatura hedionda que eu gasto com remédio contar dor de cabeça...”, sorri reflexiva. “Nossa, você é escritora. Minha mãe também escrevia poemas. Mas assim que eu nasci ela passou a ler toda noite para mim... seus filhos realmente têm sorte... (ela suspirou) eu nunca tive cabeça para ler para os meus. Acho que não ousaria... Nunca seria tão boa quanto ela. Soa ridículo, não?! Eu sei...”, perdia-se em si mesma entre olhares e gestos fracos. “Não, não soa não”, respondi-a com um grande sorriso. “Preciso ir, tenho um editor para enfrentar, casa, crianças com fome e esse calor, Deus...”, sorri e a abracei. “Obrigada. Obrigada por ter me ajudado. Obrigada por suas palavras e obrigado por ter me lido, ouvido e ajudado”.

Eu sorri, mal sabia ela que não foi a única a ser lida. Artista é isso. Ler-se nos outros, ver no próximo aquilo que o espreita, apunhala e também abençoa. Tudo que mata também pode curar. “Ouça, eu achei esse livro sabe. Minha mãe guardava esse livro numa caixinha de madeira. Ela faleceu faz pouco, mas só agora tive a ousadia de abri-la. É um livro da Cecília Meirelles”, tirou o livro da bolsa e me falava com o olhar do mais felizardo arqueólogo, desses que exploraram as pirâmides. “Sua mãe tinha bom gosto para leitura”, respondi. “Pois bem, eu queria mais um último favor seu, você poderia lê-lo para mim? Percebi que sua vida é muito corrida, como é bravo o seu editor! (risos dela) Mas leria ao menos o prefácio para mim? Gostaria que a senhora me abençoasse também, assim como é abençoada”.

E claro que não tive como negar tal apelo. Confesso que meu ego também não. Desliguei meu celular, chamamos nossos filhos e comecei a leitura não do prefácio, sim de um conto; Liberdade. E naquele momento não era uma escritora neurótica. Alagava meu mundo o sonho, a fé. Sobretudo a paciência e a neutralidade que tanto escrevia, adjetivava, pregava em meus textos. E de maneira mais exótica me senti livre, criatura de mim mesma, sem pensamentos excusos e idéias conflitantes. Era somente eu em mim mesma. (Naquela hora ao menos).
William GO

samedi, mars 10, 2007

Avant Garde


De um grande Reboliço eis que nascera a menina. Filha de um deus ou do acaso?
Não se sabe... Aliás, seu é o destino dos homens, indecifrável.
De pernas curtas e mente longa, vaga num quintal frio e escorregadio. Muito faz para manter-se de pé. Luta contra as leis da física; atrito, peso, gravidade. Nada. Cai mesmo e se ouve um choro mudo e abafado. Em terra de ninguém, choro de criança é a salvação de uma colheita quase extinta. Mas a pequena não. Abnegação era pouco para ela e muito a aquele povo.
De uma casa erguida a suor centenário e velho sai uma mulher de média estatura, vestindo saia florida e blusa engordurada. Grita pela menina. Essa se esconde em buracos de coelhos, espalhados na grande extensão de terra.
A mulher cansada, vira-se e dá os ombros “azar o dela e do diacho do homem”. Ela já comera.
Sim, odiava a menina e seu pai.
Esse, o pai da pequena criança, trouxera-lhe aquele lugar esquecido. Absorto na vida pusera-lhe ali para envelhecer.
Queria mesmo uma escrava sua que envelhecesse consigo. Atado às suas idéias socialistas, mesquinhas e unilaterais a faria sofrer.
De um canto do quintal, abarrotado de sonhos, livros e carregando um saco de semente nas costas avista-se o homem cruel e egoísta. Viera pegar com avidez e fome seu pertence precioso. O almoço.
Nele, a menina de olhos tortos e cabelos trançados confiava. Era seu pai. Com ele viveria para todo sempre. Amém!
Aproximou-se de sua cria e com um afago quase selvagem mexeu em seus cabelos e disse:
Precisa tomar outro banho. Faz calor. Ouviu? E não é banho de gato não! É banho de gente. Com sabão da costa e com o escovão.
Lançando olhar repreensivo e franzindo os lábios.
A menina avermelhou-se e deu-lhe um beijo.
Sabia que essa era a sua maneira única e paterna de lhe dizer eu te amo.
Abraçando-lhe as pernas, sua altura máxima concedida pelo tempo terreno, disse-lhe:
Também te amo!
O velho sorriu e sentaram juntos embaixo de uma amendoeira
A criança deslumbrada com a comida esquecia seu real significado e brincava com a refeição colorida e ordinária.
O pai comia e olhava o não visível. Examinava algo antes nunca olhado por ninguém e de maneira infantil, mas centrada também apreciava a menina. Os dois viam o além que habita as coisas.
Papai, dizia ela. Quem sou eu?
Pois, momento de reflexão imediata. Pois você é vocêE como sabe que eu sou eu. Como sabe que eu não sou a outra? Perguntava a menina com voz confusa.
Que outra é essa menina? O pai indeciso e preocupado titubeia em palavras calmas.
A outra que nunca fui, e que, um dia venha a ser... Joga-se no colo do pai e acaricia-lhe as rugas.
Vá brincar vai! Diz ele em busca de absolvição.
E se ela chegar enquanto estiver nos buracos de coelho? Você anota o recado, o endereço dela? Peça para contar uma história também. Pergunta a ela como é ser eu . Ah! Não a deixe falar com mamãe. Essa não escreve bem, e o senhor é um homem de letras, inteligente vai entender...
O pai a segura pelos ombros e a observa. A menina fala sem saber que é falar, gesticula coisas não inteligíveis a mortais e humanos de sua tenda, fazenda, época...
E não esqueça a idade! Pergunta depois de tudo a idade!
E para quê saber a idade? Indaga o homem abismado.
Pra saber se valerá viver até esse dia... Saber se valerá algum dia crescer.
Ele sorri e a manda levar os pratos.
A menina enrola e vai para o pomar. Ao pai, bem, ao homem só lhe resta uma saída.
Agarrar-se ao bloco de notas, ao lápis e esperar pela moça. Esperou que ela chegasse um dia qualquer. E é isso que ele faz até hoje.
William Go.

Rotina





De novo, novamente, outra vez
Conta de um até três
Lava as mãos, coma bem
Se vista charmoso
sem demoras ou desdém
Sai cedo, o ônibus não espera
Trabalho, trabalho
Meu chefe, ninguém tolera
Conta de um até dez
Pega os documentos
Pega a pasta
Cuida
do acabamento.
Vá à rua
Compra lilás
Sacar do banco
Não olhar para trás
O jornal, não comprei
O ritual se quebrou
Na fila, ainda fiquei
E o dia ainda não acabou
Conta de um até
vinte
Comida, fazer, comprar
Lavar,
Limpar,
Viver
Menos tempo pra paquerar
Vestir-se de sono e entregar-se
De vinte a quarenta d
ormir
Contando
Medindo
Somando
À linha programada servir...


William Go

dimanche, janvier 21, 2007

A estrangeira, um avião e uma escritora


Nada melhor que uma viagem para relaxar, reviver um cérebro cansado, fatigado pela selva carioca e rançosa de imaginação vencida.
Hoje pela manhã chegávamos a Portugal. Nosso vôo atrasou por problemas climáticos - não por passo planejado, pousamos em Lisboa.
Pousei em Lisboa já com um texto novo na cabeça reciclada e renovada por cinco horas turbulentas de viagem, marido, meus filhos. Fora os gringos que tanto falavam em línguas inteligíveis ou não.
Figurava o texto com alegria e orgulho. Orgulho de fazer parte daquela história indiretamente, sem ter vivido-a ou conhecer seus participantes e personagens verossímeis. Alegria não só minha, mas também da russa de olhar vermelho pela temperatura carioca, de tez avermelhada. Ela mais parecia um fruto do mar cozido em caldeiradas e vestia roupa bem colorida. Sim era fruto do mar e bem temperado. Agora a pergunta crucial: falo russo? Não! Mas falo a língua dos homens que nesse caso não é a do capitalismo voraz, que assombra muitos de várias classes e mundos, mas sim a do amor. Amor que nascera na Austrália e foi parar no Brasil.
Essa moça de 23 anos, cujo nome não sei escrever ou falar, essa moça que chamo de “Tung” por ser o mais próximo do nome original perfeito - o qual não sei, se apaixonou por André Nascimento. Filho dos Nascimento de Petrópolis que hoje reside na Gávea. Cursa Artes em uma universidade carioca de peso e quando, em viagem às terras australianas em um curso de artes aborígines, conhecera “Tung” e sua irmã “Suãi” (mais um problema fonético) em uns dos museus.
Essa jovem soube desde o princípio que o homem atípico a examinar com olhar de presa e caça uma obra de arte deixara-lhe de coração examinado.
Em pouco tempo André foi presa dos dotes e sentimentos de “Tung”.
Uma praia, que os salvara do calor temeroso fez os dois começarem o namoro. André não falava e não sabia nada de “Tung”, a russinha mal sabia o que era Brasil até que veio um convite. Tenho de confessar que convite esse só chegou após cinco meses: ir ao Brasil e conhecer a alma do povo de André, seus pais e penso eu - penso não, tenho a certeza que também iria conhecer sua nova terra e também a de seus filhos, de seus netos: da nova geração desse nascimento de amor estrangeiro. Uma legião estrangeira essa que, tomaria as paias cariocas.
Já André era moço viajado. Conhecera a Rússia aos 18 anos, há 12 anos atrás. Conhecera suas mulheres, a vida do que para ele era um marco de resistência política e um país que daria certo. Pois bem, logo após ele crescera verdadeiramente assim, reconheceu que vivia a vida. Vida Real.
“Tung” chegara ao Brasil. Pouca Roupa, óculos de sol, cores claras e um grande sorriso de gringo. Dizia: “oula”, “oubigái” e “tcháou”. Todos a entendiam. E se não a entendesse faziam-se entendidos pelo charme e alma clara de “Tung” Daí veio seu nome brasileiro: Clara. Branquinha, de olhos claros, pele alva como a neve mmais o cabelo amarelo feito gema. Era um ovo em movimento. Falava “olá”, “obrigado” e “tchau” a sua maneira. Fazendo-se clara a todos exceto aos pais de André.
Chegando a Petrópolis, nas imediações da casa que para a menina parecia um castelo de pedra medieval, tipicamente europeu de pedras brutas e escuras. Essa menina espantada pelo lar daquele moço ávido a olhar uma escultura de material artesanal marcado por um sorriso reluzente... Porque seus pais a ensinaram que o lar é onde nosso coração está. O lar de André era frio, escuro, inóspito e estava num morro íngreme de difícil acesso... Seria o coração, a alma, o espírito do rapaz assim? Iria ela encontrar terror, morbidez em terras onde se dança e canta felicidade? Será o homem que conhecera fantasia reciclável de carnaval? Ator a jogar com seu mais íntimo sentimento? Palhaço de companhia teatral de Moscou? Será que se chama André mesmo? Ou é um apelo a uma salvação de alma, corpo, todo?! A clandestina estava ali, de frente ao monumento erguido a ela e a seus filhos e não o queria! Era amaldiçoado. Era vil e peçonhento... Não era esse homem brasileiro, era nazista! Queria mais que comer-lhe a carne, desejava também beber-lhe o sangue frio e ácido que pulsava freneticamente em seu corpo; inundava a face de rubro terror. Trêmula respirava fundo, o ar lhe cortava as entranhas como só quando pequena a ocorreu... Sim, pois uma vez, quando saíra para o lago – desobedecendo a seu pai, mesmo sabendo que o inverno entrara fazia pouco foi admirar e tentar estrear os patins novos no gelo. Resultado: caiu no lago. O gelo ainda estava frágil assim como o seu coração naquele momento...
Os pais do rapaz, vendo a figura deslocada à beira de sua porta, perguntou-lhe o nome e que fazia ali. Ela não soube explicar. Chamaram André – o único a entender o “português claro” de “Tung”. Esse a apresentou como noiva. Choque para os pais.“Tung” consentiu. Era sim a senhora Nascimento. O fez de forma clara e natural. Mas os pais do menino tinham planos para ele: Mas francesinha “Marie Chambleux” filha da família renomada de Paris os “Chambleux”? Ou a inglesa “Elisabeth Bridwood” filha de um velho amigo de seu pai e dono de uma grande multinacional?
Não. Escolhera a russa. Com ela queria viver! Mas os pais fazendo vista grossa e, para não denegarem, o fizeram esperar mais um tempo. O que eram cinco meses? É uma decisão séria a ser feita! O casal respeitou as palavras sábias, porém interesseiras dos senhores. André até relutou, já a mocinha o repreendeu rapidamente: não se deve retrucar os mais velhos. Aprendera em seu país. País que os pais de André pouco conhecem, vivem em Nova York, cidades de massa, não têm tempo para cultura de conteúdo.
A sorte estava lançada. Passaram-se três maravilhosas semanas e Clara voltaria a ser “Tung”, se não fosse o fato do nascimento do herdeiro dos Nascimento. Não se impõe regra ao amor e como diz a Lispector, amor não é calculo matemático. Não há prazos nem meios. Acontece mesmo.
O que seria feito? Não se sabia, ainda. A mulher dourada voltaria a sua terra e após dois meses se casariam lá – a pedidos dos avós que não queriam uma nora grávida do neto no altar. Após o nascimento da criança russa, viria o princípio da nova legião Clara Nascimento redescobrir o Brasil e mesclar culturas.
Infelizmente foi o pouco e o necessário que André me contara no avião, junto à foto de Clara agarrada ao peito. Como é linda a menina cujo nome brasileiro é Ana Clara; homenagem à avó Ana Margarida e à mãe Clara. “É muito linda sim” derramei as palavras imbuídas de sentimentos aquáticos e oculares.
Um dos meus meninos acordou e eu prontamente fui socorrê-lo e ao avião também, pois, berreiro de crianças não é de se agüentar.
Distanciei-me de André e só o revi quando descia do avião. Este me deu o seu endereço. Gentilmente lhe passei o meu. Disse que era escritora e que sua história estaria na minha próxima coluna se ele me jurasse dizer o final! O jovem pai sorriu, consentiu em mandar-me fotos dele, de sua esposa e da menina.
Fiz o mesmo. Manteríamos contato.
Descia do avião e não era mais eu mesma. Sentia o final daquela história e assim me sentia ferramenta fundamental para o final daquele mito de viagem em avião. Das minhas mãos sairiam os códigos a darem real significado a tamanha façanha do destino. E foi basicamente isso que fiz. Não era necessário mais nada. Fui Clara e “Tung” com um pouco de meu Eu e mais nada desde então aconteceu mesmo...

dimanche, novembre 19, 2006

Fatalidades




Hoje em dia as pessoas têm vergonha de dizer “eu te amo”. Sentem-se ressabiadas, tentam inventar coisas, maneiras de fazer tal declaração.
Marta, mulher que pede pouco. Alta e de corpo delgado. Universitária com uma filha. Ulisses, homem de meia idade. Infeliz, separado legalmente. Nunca cursou uma cadeira universitária sequer.
O que essas pessoas têm em comum? O fato de nunca terem se conhecido.
Se se conhecessem que passaria? Nada, não sei. Não vivo em mente nem em coração alheios...








Há gente que pergunta se a vida ‘tá boa, se ‘tá tudo equilibrado, se o dinheiro ‘tá dando ou sei lá que mais...
Mas ninguém pergunta se o coração ‘tá equilibrado, os olhos ‘tão inteiros ou se a alma passa fome.
Um outro dia, minha filha me perguntou o porquê de não ter me casado. Perguntou se eu tinha medo de amar. Ela jura, selando os dedos com os lábios, não fazer pirraça, mau criação e até sorriria se ele a chamasse de filha.
Eu a abracei e lhe beijei a testa. Com meu corpo trêmulo e olhos derretidos fui ao meu quarto, “não é coisa para criança ver adulto chorar”.
A menina me olhando obscenamente fala “você ‘tá chorando, mamãe! Quanto tempo você não ri? Hein?”.
Eu dei um sorriso debochado e seco, então ela rebateu:
“Sei...”
Ela já tem idade para ironizar.
Deitei na cama e me cobri toda até os grandes cabelos, que só me atrapalham. Ouvia meu coração.
“Mamãe, ta na hora de você arrumar um namorado!”, esbravejou-a.
Eu sorri, a puxei para a cama, a abracei e a beijei.
“Isso é coisa de adulto Lóri, de gente grande. Vai brincar com sua filha, pentear os cabelos da Jú...”. Corta-me com ar de criança: “Luisa, mamãe!”.
Sentadas na cama, eu concordo.
“Como ela levanta, embola os cabelos que lhe atrapalham a fronte, ajeita o vestido... Parece tanto comigo...”.
“Posso usar seu pente de cabo branco, mãe?!”, diz com voz de seda.
“Claro, querida, o que é meu é seu!”. Agora choro de emoção. “Como Lóri cresceu... parece mulher em miniatura.”
A menina pega o pente como uma rainha e o agarra nas mãos como uma águia quando vitoriosa tem a sua presa.
“Mamãe, você é feliz?”. Pergunta Lóri.
“Sim querida, eu tenho você”. Sorri.
“E se um dia eu sair?”, me desafiou com os olhos.
“Sair para onde? Para casa de uma amiguinha?”. Esmorecida e ameaçada, contestei.
“Ué, quando eu casar, quando a Luisa virar uma grande bailarina e viajar muiiito, quem vai arrumar o cabelo dela assim como você faz com o meu?!”, diz a pequena advogada.
Muda e de olhos sensíveis, a mãe responde “A mamãe vai entender e...”.
A menina reprova: “Chorando de novo mamãe?”.
“Eu!? Não querida é que...”, disse sem saber o que dizer.
“Mãe, quando a gente se casa, a gente fica triste? Porque eu não quero ficar triste... quero ficar só com a Luisa então”, revela a menina.
Fiquei de rosto claro e a abracei, coloquei-a sentada em meu colo e disse: “Você não ia pentear o cabelo da sua filha?”.
Ela consente com a cabeça e procura o pente na cama.
Nessa hora, o vazio me ocorre assim como a fraqueza dos homens e a insegurança dos deuses. “Quem é essa mulher que me desnuda, me bate na cara com palavras feitas de meu próprio sangue?! O que ela quer me mostrar? O que o mundo quer de mim? O que será a minha redenção?”.
Sem saber ao certo que fazer, seguro Lóri e digo: “Eu te amo, filha minha”. Como essas palavras ecoavam em minha mente “filha minha”...
“Achei o pente mamãe”, cortando meu transe hipnótico.
Penso eu: “Crianças! É verdade, elas não entendem o mundo da dor, da dura realidade. Ai, minha filha!”.
Mais segura de mim, falo: “Agora vá cuidar de sua filha!”.
A menina levanta, abraça a mãe e penteia seus cabelos. Olhando-a nos olhos, diz:
“Já estou cuidando mamãe. Eu também te amo!”.
A mão da menina ampara as lágrimas da mãe. Fala com ar de gente crescida:
“Preciso te arrumar um namorado!!”
As duas riem e se abraçam de prazer.

Procura-se alguém


Os olhos acostam, acordam e ainda estão chovendo. O tempo não pára preso com cola-quente em olhos redondos, grandes e inchados; estão bêbados de você.
Na sacada da casa rosa, espera suas pupilas dengosas dançarem nas nesgas passageiras de chuva primaveril: densa e envolvente.
O vento corta a pele e um arrepio invernal corta a face. “Onde estivesse esta noite?”. O rosto jovem se entardece, as mãos marcadas brincam em meio à brisa e logo um coração vazio se enche.
O chuveiro jorra água quente e elucidativa que aquece o corpo espantado. Nem olho ou traço nem rugas ou restos de luz. A salvação: inventar mentiras verdadeiras para conforto cardiovascular.
O corpo cativo e caótico debruça-se no lavabo; silêncio... Os lábios aflitos temerosos tremulantes são suprimidos pela boca que é seca e reservada. Um suspiro, só um. Esse que habita a alma vem a furo, mas nada.
Prestes a noite tudo tece chovendo.
Bem, está o cansaço, se está noite.






“Em meio a gotas de ducha, lágrimas, gotas de sangue exprimidas da minha alma pelas frágeis e amargas, se encontram amarradas na face que perdi.” Wil Gomes.

samedi, novembre 18, 2006

Adormecida (Pois é, alguém tem de morrer)




(Inspirado nas obras e homenagens à Frida Khalo)

Ela parou em meio ao tudo e perguntou a si se tudo aquilo tinha sentido. Se tudo aquilo ainda era real. O que era vida e o que era alucinação. As vozes ecoavam pelos seus tímpanos, cortava-os e os ônibus a passar naquela tarde escaldante de verão.
Será que aquilo tudo tinha sentido para ela? Porque os ônibus estavam meio vazios e não meio cheios? Onde tudo isso iria terminar?
Mais um gole de vinho, mais um aperto no tabaco... Era inútil para esse ser. Nem a morte, mas nem essa representava vida. Tudo se fôra para ela. O parque, os patos, o lago. Será que cruzaria o lago? Sim, porque temia as turvas águas. Conseguiria mergulhar profundamente em si mesma? Seria como cortar sua identidade, pisar em suas feridas, arrancar seus cabelos na ferrugem da tesoura, a tesoura que rasgaria seu amanhã... Não se teria mais noite. Pausa para um tango, outro trago, mais um gole, mais um ônibus, mais um degrau a menos.
Quem era ela? Pois não escolhera a morte! Entretanto, em tarde quente de verão o corpo voa, desolidifica, desloca-se de seu eu verdadeiro e voa em meio a patos marrecos. E os ônibus? Bem, esses estão vazios porque assim como a vida do ser humano, é provido de nada, de ar movido à gasolina, a sangue, o combustível humano. Porém se pára em um ponto e não cruza o lago. Ela morreria afogada e estilhaçada pela ferrugem dos dias, dos anos entre a indiferença e o medo com suas tesouras pontiagudas?
“Encha o copo! A garrafa secou.” Agora se come o fumo. No entanto de quê adianta relutar se o calor se põe assim como o sol e voltar a ser uma em meio à noite? Noite é hora fria, hora escura e cheia de mistérios, é à noite que tudo se torna estático, um só. A noite tem sua identidade e é por si mesma o equilíbrio de um ser. È nesse período que as plantas dormem de olhos semi-abertos, pois um deles deseja, chama a planta ao lado e já o outro receia o amanhã por vir, reprimi-se.
As tesouras voltam às gavetas do comodismo. A vida se expande e se torna gélida. Já é possível cruzar o lago. Sem patos, ou marrecos; congelado. Agora a lua assombra seu corpo nu. È hora de o palhaço despir sua face. É hora de tudo tornar-se elétrico. È necessário o nascer da próxima bola de sangue.



“O silêncio da solidão é a ilusão dolorosa para quem brinca de viver”
Wil Gomes.

samedi, octobre 21, 2006

E era Noite...Noite fria


Na rua espia
a tez enfria
em meio a
Noite
fria

Nem beijo nem grito
receios ou mitos
Só lágrimas, a solução

Era noite minha
Lua minha
vejo da rua
a noite fria

Sinto.
Meu coração esfria,
sem juras,
sem lamúrias:
Tudo a passar

Somente eu
sem você
Em noite minha
Noite
fria

samedi, octobre 07, 2006

Internet de pensamentos: declarações, emoções transcritas, traduzidas,jazidas, envoltas e revoltas. Tudo em página WEB



Sei que a proposta desse espaço não é a de diário pessoal. Muito menos retrato de vida alheia. Não o fiz assim e assim não o será.
Mas isso adquiriu forma poética. Este conteúdo, que já fora motivo para rios de lágrimas e tempestades internas, está aqui dirigido e digerido em forma de sentimentos, poética e pensamentos condizentes com meu Eu.

"Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada."
(Motivo - Cecília Meireles)


" Eu não tenho compromisso com essas expectativas que as pessoas têm. O meu compromisso é entre mim e a música. É só o que eu entendo disso" (Maria Rita)


" WIL - cansei de correr como Alice" diz:
acho q estou melhor...
" WIL - cansei de correr como Alice" diz:
já olhou p o mar e
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
vc vê as águas calmas e cristalinas
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
o chão e a multiplicidade de cores e vidas
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
que transitam ali?
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
já viu??
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
tipo olhar p a água cristalina!!
JH! diz:
Ah o mar já vi.
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
tudo num eixo pulsante...
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
então eu sou assim..
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
e qndo a a água é levemente tocada
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
o q passa?
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
se torna turva, e o chão não se vê
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
o movimento aumenta, as pessoas entram e saem...nossa!!
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
caos, caos, caos, o eixo se rompe
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
até que tudo PÁRA!!!!
JH! diz:
Você deveria escrever isso.
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
e volta-se a realidadezinha Medilcre de antes
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
vc acha?
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
eu estou cansado de escrever..
JH! diz:
Acho!
JH! diz:
De verdade.
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
de declamar..
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
de ver um mundo em flor
"cansei de correr como Alice" diz:
botões,
JH! diz:
Você deveria aproveitar esses movimentos de ímpeto e escrever.
JH! diz:
Ajuda a aliviar.
JH! diz:
E sai bom.
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
tecido pelos toques literários e em formas de bolo
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
eu quero que me enxerguem!
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
q adinta escrever se ninguém entende sua língua?
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
sua caligrafia...SUA SINTAXE É VAZIA
"WIL - cansei de correr como Alice" diz:
considerada esquizofrênica..
JH! diz:
Cada vez mais acho que você deveria escrever isso."

(Fragmentos de uma conversa minha com uma amigo que tenho muito apreço:
Sr. J. Henrique Drumond. Conversa essa que se realizou por MSN.)

"Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta"
(Motivo - Cecília Meireles)

"Eu sou exigente. Sou exigente comigo mesma até! Então, eu tenho que cantar alguma coisa. Seja melodicamente falando, ou a poesia. Que eu me identifique ou conheça alguém que se identifique. Não vem ao caso... mas enfim, tem que ter alguma coisa forte pra mim..."
(Maria Rita)




"A poesia está no corpo, nos olhos e alma de quem a escreve, entretanto a sua essência mais viva e mais pura está nos meandros e nas entranhas de quem a lê ou sabe se ler nela" Wil Gomes

" Assim, entender de si é como enteder de poesia: entender dos próprios sentimentos e mistérios." Wil Gomes

" Poesia é amor da alma e não a mando sociais. Pobre são aqueles que não se vêm nela assim como não se vêm em um espelho. Pobres vampiros que não a vêm ou a sentem. E mais Pobres são por não poderem sonhar-las" Wil Gomes.

Talvez não seja muito elucidativo, coisa e tal. Porém é o que se é sentido.